Desafio #29: A Menina Que Roubava – A Cena Nos – Livros

em quarta-feira, 18 de abril de 2018

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É difícil falar em Bonequinha de Luxo sem produzir uma imagem mental de Audrey Hepburn num tubinho preto, cheia de classe, segurando uma cigarreira, encarnada em Holly Golightly, com sua personalidade tagarela e inquieta, sua independência, e seu jeito espirituoso e extrovertido de encarar a vida.


BONEQUINHA DE LUXO
Título Original: Breakfast at Tiffany’s
Autor: Truman Capote
Editora: Companhia das Letra
Páginas: 145
Gênero: Novela

Sinopse:
Em Bonequinha de Luxo, novela de 1958, escrita com mão levíssima, o escritor norte-americano Truman Capote acompanha as estripulias de Holly Golightly, a jovem que escapa da vida besta do interior para tentar a sorte na Nova York dos anos da Segunda Guerra. Moça de hábitos e horários nada ortodoxos, Holly põe em polvorosa uma galeria de personagens que vai de um mafioso preso a um escritor inédito, passando por um fotógrafo japonês, uma modelo gaga e uma cantora rouca – para não falar de um certo diplomata brasileiro. Tudo isso sem abandonar a visão de uma vida de luxo, calma e volúpia, se possível bem longe do Texas e bem perto da joalheria Tiffany’s. Celebrizada nas telas de cinema por Audrey Hepburn no filme homônimo de Blake Edwards, Holly é uma das criações mais felizes de Capote, mistura inextrincável de ninfa diáfana e moça roçuda, tão viva e sedutora hoje como quase meio século atrás.
EEEEE

Embora maravilhoso, o livro Bonequinha de Luxo, de Truman Capote, é somente a sombra do que o filme o tornou. Para começar, temos apenas uma vaga ideia de como Holly se comportava numa festa, pois não chegamos a vê-la realmente em ação. Toda a história é narrada por seu vizinho, a quem ela chama de Fred, o nome de seu irmão. O verdadeiro nome dele não chega a ser revelado, e, na qualidade de narrador-observador, esse amigo anônimo contou apenas o que viu e ouviu sobre Holly, de modo que todas as ações do livro acontecem somente dentro do apartamento dela, ou dele, e no bar do Joe Bell, que ambos frequentavam às vezes. Fred e Holly somente saem destes ambientes poucas vezes: quando ela o conduz a roubar uma máscara de festa numa lojinha – uma das cenas mais descontraídas do filme –, uma vez em que ele a vê entrando na biblioteca para tomar notas de algum assunto – provavelmente sobre o Brasil, pois José já aparecia em seu círculo social na época –, quando passeiam a cavalo no Central Park, e quando ele a leva ao aeroporto para tomar o voo para o Brasil.


Então é de se esperar que as ações fiquem limitadas a um número restrito de personagens. Exceto que Holly recebe muitos amigos em seu apartamento todas as noites – em sua maioria homens –, e Fred acabou sendo convidado para participar de algumas dessas festas.
No filme ficou apenas subentendido, mas o livro deixa claro que Holly era uma garota de programa – pode ficar tranquilo(a), porque o livro não possui nenhuma cena erótica. É uma história bela, sem precisar apelar a vulgaridades –, que somente acompanhava homens ricos, com quem ela pudesse sonhar em se casar um dia, e se tornar uma mulher respeitável. E embora mencione muitas vezes ao longo da narrativa, não chegamos de fato a vê-la pedindo dinheiro aos cavalheiros para ir ao toilette retocar a maquiagem.
O filme faz diversos contrapontos à história do livro, tornando-se mais ou menos oposto a ele em muitos aspectos: enquanto no filme Holly se muda para Nova York para buscar o sonho de se tornar uma famosa atriz de Hollywood e casar-se com algum ricaço, no livro, Holly teve sua oportunidade de se tornar uma atriz famosa, e fugiu disso, convencida de que jamais poderia ser feliz em tal trabalho.
Em sua jornada em busca da felicidade, Holly é apresentada com uma personalidade frágil e confusa. Também tem um quê de ingenuidade, pois parece não se dar conta de que seu amigo mafioso Sally Tomato, a quem é paga para visitar todas as quintas-feiras na prisão, a usa como mensageira para passar informações aos seus comparsas do lado de fora, codificadas em forma de “previsões do tempo”.
O filme também faz uma pequena correção em relação ao livro: o diplomata brasileiro com quem Holly almeja se casar possui um sobrenome nada brasileiro no livro, Ybarra-Jaegar. Embora o autor explique que a mãe de José era alemã, isso não explica o sobrenome Ybarra, que soa mais hispânico que português. No filme, para evitar polêmica etimológica ou regional, o sobrenome de José foi trocado para “da Silva Pereira”. Agora, sim, acredito que é meu compatriota. Exceto por seu intérprete, que era natural de Madri.
Algo que chama a atenção e chega a ser irônico é que, embora o título original seja Breakfast at Tiffany’s (Café da Manhã na Tiffany’s), no livro, Holly não é mostrada na famosa joalheria de Nova York nem uma única vez; apenas é mencionado que ela gosta de ir lá quando se sente deprimida. Ela também costuma comparar a felicidade que procura à sensação de observar as vitrines da Tiffany’s pela manhã.

O final dos personagens no livro também é completamente diferente do filme.
Pessoalmente, gosto mais da história de Holly Golightly no filme. É melhor em muitos aspectos: da cenografia à escolha dos atores, o desenvolvimento dos personagens, o figurino, as festas... Há um glamour em Bonequinha de Luxo, uma magia que somente o cinema soube transmitir. E acima de tudo, o filme tem Audrey Hepburn, e nenhuma outra atriz antes ou depois dela interpretaria Holly Golightly com tanta maestria. Ela capturou perfeitamente todos os traços que tornavam Holly uma das personagens mais irresistíveis da literatura mundial. Ela é a pepita de ouro que brilha numa história mais ou menos, e transforma uma história sem grandes ações ou pretensões, numa das mais deliciosas de todos os tempos.


Algumas curiosidades a respeito do filme:
* A primeira atriz cotada para dar vida à Holly foi Marilyn Monroe – que teria sido escolhida pelo próprio Truman Capote. Não tenho absolutamente nada contra a diva loira do cinema americano. Embora tenha ancorado seu sucesso na beleza, e, assumidamente conquistado seus primeiros papéis em Hollywood através do “teste do sofá”, é inegável que Norma Jean Baker era uma atriz talentosa. Mas não dá para imaginar outra pessoa na pele da Bonequinha de Luxo, senão Audrey. Enquanto Marilyn poderia conferir sensualidade à personagem, Audrey consagrou-a com sua elegância e sua postura, o equilíbrio perfeito entre descontração e refinamento.
* Audrey Hepburn recebeu por este papel o maior cachê pago a uma atriz até então: 750 mil dólares. Seu recorde foi superado dois anos depois por Elizabeth Taylor, que recebeu a singela quantia de um milhão de dólares para interpretar Cleópatra. Embora ambos os filmes tenham se tornado cult, na época de seu lançamento, Cleópatra foi um relativo fracasso de bilheteria, que quase levou a 20th Century Fox, produtora e financiadora do filme, à falência.


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