Quando eu vi “O Conto
dos Três Irmãos” no filme “Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 1”,
tive a impressão de que este livro era bem mais infantil.
“Os Contos de Beedle, o Bardo” é uma versão
mágica dos contos de fadas que todos conhecemos desde criança. Uma história
curta, que se finaliza ensinando lições de bondade, generosidade e gratidão.
É provável que
tenham sido inspirados em contos tradicionais dos Irmãos Grimm e outros contistas infantis, como observei.
A principal lição
neste conto é a caridade. Fala de um bruxo egoísta que herdou do pai uma panela
velha que o seguia por toda parte fazendo-o conhecer os males que atormentavam
os moradores trouxas (creio que não é necessário explicar que esta é a forma
como nos não-bruxos são chamados pelos bruxos criados por J.K. Rowling) do
vilarejo, depois que ele se recusou a usar sua magia para ajudá-los, como seu
pai fazia.
De acordo com os
comentários de Dumbledore ao fim do conto, Beedle viveu numa época em que a
discriminação aos trouxas por parte dos bruxos era demasiado mais poderosa do
que nos dias de Harry Potter, pois os trouxas temiam e caçavam os bruxos.
Beedle parece ser
um bruxo com instintos revolucionários, que tentou inspirar nas crianças bruxas
o amor e o respeito aos trouxas, de modo que ambos os povos pudessem conviver
em harmonia.
Imagino que a
autora tenha se inspirado em “O Pote
Mágico de Mingau”, dos Irmãos Grimm quando escreveu “O Bruxo e o Caldeirão Saltitante”.
Este conto é
sobre uma criança que recebeu das fadas um pote que fazia um mingau delicioso,
mas o pote caiu nas mãos de um homem ambicioso e mau, que fez o pote cozinhar
cada vez mais mingau para que ele o vendesse, até que a cidade toda ficou
inundada pelo mingau. Só quando ele o restituiu à criança, foi que o pote parou
de cozinhar.
A Fonte da Sorte
Este conto é
sobre três bruxas e um cavaleiro azarado trouxa que têm a oportunidade de
chegar à fonte da sorte, onde apenas um poderá se banhar, e se livrar de seus
males. A primeira bruxa quer se curar de uma enfermidade, a segunda livrar-se
da pobreza, e a terceira curar seu coração partido. O cavaleiro, por sua vez,
quer livrar-se do azar.
ATENÇÃO: O próximo parágrafo contém SPOILERS!
Após enfrentar
três obstáculos e chegar à fonte, a segunda bruxa, que quer se livrar da
pobreza, consegue curar a enfermidade da primeira com uma mistura de ervas, com
a qual pode recuperar seu ouro, e a terceira bruxa livrou-se de todas as
lembranças de seu antigo amor no riacho, último obstáculo para alcançar a
fonte. Então as três decidem que é o cavaleiro quem deve se banhar na fonte, e
após isso os quatro partem felizes, de posse de tudo o que desejaram, sem nunca
saber nem suspeitar que a fonte não possuía encanto algum.
Eu vejo algumas
semelhanças entre este conto e “O Mágico
de Oz”.
Ambas as
histórias relatam a jornada de quatro pessoas, cada uma com suas desventuras,
esperando alcançar, por magia, a resolução de seus problemas, quando, na
verdade, têm tudo o que precisam, e no final o mágico ou a fonte, apenas fazem
com que se sugestionem e acreditem que tudo está resolvido.
O Coração Peludo do Mago
Este conto chega
a ser quase uma história de terror. Um mago frio e indiferente se utilizou das
artes das trevas para retirar o próprio coração de dentro do peito e trancá-lo
numa caixa de cristal, esperando assim, se tornar imune ao amor, o que ele
julgava uma fraqueza.
No entanto, ao
perceber a necessidade – mais ao ego do que ao emocional – de ter uma esposa, o
mago teve que revelar à sua escolhida o seu terrível segredo.
[SPOILERS] Ao ver o coração encolhido e peludo
na caixa, a moça horrorizada, implora ao mago que o restitua ao seu lugar,
porém isto acaba por se tornar a desgraça de ambos, pois o coração ficara tanto
tempo trancado que se tornou selvagem como um animal e, dominando o mago,
acabou por causar a morte de ambos – o mago e sua donzela. [FIM DOS SPOILERS]
Este conto se
distancia dos outros e desqualifica a obra de Beedle como exclusivamente infantil.
Acredito que esta
possa ser uma versão macabra de “A Bela e
a Fera”, pois esta trata de um príncipe egoísta e orgulhoso que se recusa a
ajudar uma velhinha em troca de uma rosa, e ela se revela uma poderosa
feiticeira, que o transforma numa fera terrível.
A rosa que ela
tentou lhe oferecer fica protegida dentro de uma cúpula de vidro ou cristal, e
o feitiço só pode ser quebrado se, antes que caia a última pétala, ele
conseguir que uma mulher se apaixone por ele, apesar de sua aparência monstruosa.
Este conto fala
sobre um rei trouxa que acredita que poderá se tornar um bruxo se tiver
instruções de magia. O homem que o está ensinando, no entanto, é um charlatão
trouxa, que viu na ignorância do rei uma oportunidade de enriquecer. Os
problemas começam quando Babbitty, a lavadeira – esta sim, uma bruxa legítima –
percebe que aquele homem está mentindo, e passa a fazer os feitiços no lugar do
rei, sem que este soubesse.
Quando o capitão
da Brigada de Caçadores de Bruxos pede que o rei use magia para ressuscitar um
dos cães que havia morrido naquele dia, todos percebem que o rei não possui
mágica alguma, pois Babbitty, sabendo que nenhum feitiço era capaz de
ressuscitar os mortos, nem ao menos se esforçou para fazer algo a respeito.
Então o charlatão
denuncia a bruxa, que é perseguida e se esconde num buraco debaixo de uma
árvore, e mesmo depois que ela é cortada, continua gargalhando. Depois que
todos vão embora, Babbitty sai de baixo do toco sob a forma de uma coelha.
Este é o único
conto que eu não consegui associar a nenhum conto conhecido, ainda que o coelho
falante me faça lembrar “Alice No País
das Maravilhas”, mas não creio que tenha sido inspirado nela.
O fato é que uma
história em que alguém realiza grandes proezas, enquanto algum oportunista leva
toda a fama não é exatamente uma novidade.
Este conto,
creio, a maioria das pessoas conhece bem – alguns talvez, até de cor, visto que
Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 1, que traz o conto narrado por
Hermione na casa de Xenófilo Lovegood, tem sido transmitido ao menos uma vez
por semana nos canais HBO. Mas vamos ao resumo:
Três irmãos
caminham por uma estrada deserta e tortuosa ao anoitecer, quando se deparam com
um perigoso rio, e agitando suas varinhas, constroem uma ponte. Então a Morte
finge recompensá-los por terem lhe escapado, concedendo a cada irmão o seu
pedido: ao mais velho uma varinha invencível, ao segundo uma pedra capaz de
ressuscitar os mortos, e ao terceiro e mais humilde, a própria Capa da
Invisibilidade, para que ela não possa segui-lo.
Obviamente,
aquele foi um artifício da Morte para levá-los em seguida. O primeiro irmão se
gaba de ter uma varinha invencível, e acaba com a garganta cortada por um bruxo
que a rouba no meio da noite. O segundo irmão se mata para se unir à moça a
quem quis desposar antes de sua morte precoce, pois, embora ressuscitada pela
pedra, continua triste e fria, porque não pertence mais ao mundo dos mortais.
Apenas o terceiro
irmão tem uma vida longa, até, em idade avançada, despir a Capa da
Invisibilidade e dá-la ao seu filho, acolhendo a morte como uma velha amiga e
seguindo-a de bom grado.
Creio que J.K.
Rowling tenha se inspirado em “A Água da
Vida”, dos Irmãos Grimm para escrever este conto.
Neste, três
irmãos querem salvar a vida do pai, que está muito doente, e um a um vão em
busca da fonte da água da vida, para trazer um pouco para o seu pai.
O mais velho
encontra um anão com vestes esfarrapadas no caminho, e lhe fala com arrogância,
então o anão lhe roga uma praga, e ele acaba entalado entre barrancos. O mesmo
sucede ao segundo, mas o terceiro fala com amabilidade ao anão, e este lhe
indica o caminho para a fonte.
Depois de apanhar
a água e libertar o povo do castelo de um feitiço que os mantinha num sono
letárgico, o terceiro irmão se comprometeu a voltar dali a um ano e desposar a
princesa.
De posse de uma
espada e um saquinho de trigo inesgotável, ele ajuda um rei a vencer seus
inimigos numa guerra e encontra novamente o anão, e lhe pede que liberte seus
irmãos. O anão avisa que ele se arrependerá, mas faz o que ele pede. Então os
irmãos roubam o frasco com a Água da Vida e o trocam por outro com água
salgada, e acusam o irmão mais novo de tentar envenenar seu pai.
A mentira acaba
sendo revelada quando o rei que foi ajudado pelo irmão mais novo lhe traz
valiosos presentes como recompensa pela ajuda, mas o príncipe está longe.
Decorridos um
ano, a princesa manda calçar a estrada com ouro e pedras preciosas, e dá ordens
aos guardas para que, quando seu príncipe vier pela estrada o deixem entrar,
mas qualquer outro que vier pelo lado da estrada seja expulso a chicotadas.
O irmão mais
velho tenta se passar pelo irmão mais novo e vem pelo lado direito da estrada
para não estragar o ouro, e é expulso a chicotadas. O segundo vem pelo lado
esquerdo da estrada para não danificá-la e tem o mesmo destino. O terceiro vem
pelo meio da estrada, sem perceber que ela foi calçada com ouro, e se casa com
a princesa.
Então ela vai com
ele ao reino de seu pai, onde ele denuncia a traição de seus irmãos, e o rei
ordena que sejam castigados, mas eles fogem e são apanhados por uma tempestade
que traga seu navio e eles perecem miseravelmente no mar.
Meus Comentários Sobre o Livro
Não é segredo para
ninguém que sou apaixonada por histórias sobre magia, especialmente a saga Harry
Potter. Quando comprei “Os contos de
Beedle, o Bardo”, levada pela curiosidade atiçada pelo Conto dos Três
Irmãos desde o livro “Harry Potter e as
Relíquias da Morte”, e depois mais atiçada ainda pelo filme, tinha uma
ideia completamente diferente da obra.
O conto que mais
me surpreendeu, num livro supostamente escrito para crianças – digo
supostamente porque, assim como eu, muitos adultos apreciam a obra de J.K.
Rowling, talvez mais ainda que os pequeninos –, foi “O Coração Peludo do Mago”.
Verdade é que
algumas histórias que contamos para as crianças, originalmente, não eram tão
bonitas ou infantis. Algumas tinham finais trágicos – como a Chapeuzinho
Vermelho, que no final do conto original é devorada pelo lobo, e A Bela
Adormecida, que acordou grávida do príncipe, que não era tão cortês quanto na
versão dos Irmãos Grimm.
“O Coração Peludo do Mago” preserva o
conteúdo original da maioria dos contos infantis, e pode ser meio chocante para
quem esperava encontrar um tradicional final feliz.
Pessoalmente,
gosto mais quando os contos terminam assim, de forma trágica ou misteriosa, com
aquele ar de quem põe reticências em lugar de um ponto final, porque ninguém
espera por isso. Para as crianças, porém, é melhor contar o final feliz.
Afinal, elas terão a vida inteira para descobrir que isso nem sempre vai
acontecer, mas pelo menos terão esperança.
Definitivamente
valeu a pena conhecer as histórias de Beedle. Espero que a autora se empolgue e
decida escrever outros volumes com novos contos. De minha parte, tem uma fã
cativa!
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