Um
dos meus filmes em desenho animado favoritos desde sempre foi Anastásia. Tudo
bem que, na infância, a versão que eu conheci melhor foi a da Burbank da
Austrália, de 1997 – um dos exemplares da minha coleção de VHSs. Mas existe uma
versão, lançada no mesmo ano pela 20th Century Fox que ficou muito mais
conhecida. E ao contrário do que muitos pensam – talvez pela semelhança
clássica com os conto de fadas; talvez por causa da alta qualidade do roteiro e
da arte do desenho –, a Disney não teve nada a ver com a produção desta
animação.
O
filme é mais ou menos baseado numa história real. Digo mais ou menos, porque
criou-se um grande romance em torno da história da Grã-duquesa Anastásia
Romanov, filha do último Czar da Rússia Imperial, Nicolau II. A história
contada no desenho, e que antes disso inspirou um filme estrelado por Ingrid
Bergman, em 1956, é basicamente uma lenda urbana.
Supostamente,
a Grã-duquesa Anastásia, a mais nova das filhas do Czar, teria sobrevivido ao
massacre de sua família em 1918. Ao longo de décadas, várias mulheres
reivindicaram a identidade de Anastásia Romanov, uma vez que a localização de
sua sepultura era desconhecida no mínimo até o início dos anos 1990. Em algum momento,
os estúdios descobriram que sua história parecia um conto de fadas, e decidiram
transformá-la numa animação.
E
ei-la aqui.
Para
não tornar a review cansativa, vou deixar o contexto histórico para o final.
Então, tenham em mente que a maior parte da trama é mera ficção.
A
história começa em 1916, supostamente durante a Revolução Russa. Nicolau, Czar
da Rússia Imperial promovera um baile para comemorar os trezentos anos de
reinado da família Romanov. Naquela noite, a Imperatriz viúva Maria deu uma caixinha
de música à sua neta mais nova, Anastásia, de oito anos, que se queixava porque
a avó estava de mudança para Paris nos próximos dias. Além da caixinha de
música, que tocava a canção de ninar com a qual a avó costumava colocar
Anastásia para dormir, ela lhe deu também um medalhão com a inscrição “juntas
em Paris”, para confortar a menina.
O
que elas não sabiam era que aquela noite seria o último momento feliz de sua
família. Rasputin, um poderoso feiticeiro, que iniciou a Revolução, vendeu a
alma em troca do poder para exterminar a família Romanov.
E
como Rasputin não era político, ele cumpriu direitinho a promessa, massacrando
toda a família com o auxílio dos seus Amigos do Outro Lado... Não, peraí, esse
foi o Dr. Facillier em A Princesa e o Sapo... Realmente não sei como chamar
aqueles diabinhos etéreos que Rasputin conjurou contra os Romanov naquela
noite. Seja lá como for, os espectros mortais invadiram o castelo em São
Petersburgo e mataram toda a família, exceto Anastásia e sua avó. Quando a
pequena Grã-duquesa voltou para buscar a caixinha de música esquecida em seu
quarto, e a avó voltou para apressá-la, um jovem criado da cozinha, mais ou
menos da idade de Anastásia indicou-lhes uma passagem secreta escondida na
parede, que dava no alojamento dos criados, por onde elas poderiam escapar em
segurança.
Então
avó e neta correram para tomar o trem para Paris, mas este já estava partindo
quando chegaram à estação. A Imperatriz viúva conseguiu embarcar, mas Anastásia
não teve a mesma sorte. A menina acabou se soltando da mão da avó com o trem em
movimento, e bateu a cabeça no piso da estação, perdendo a memória.
Por
alguma razão, a Imperatriz não saltou na próxima estação e pegou o trem voltando
para descobrir o que aconteceu com sua netinha – muito amor envolvido, sem dúvida...
Dez
anos depois, começam a circular nos jornais de São Petersburgo, última capital
do Império Russo, rumores sobre a sobrevivência da Grã-duquesa Anastásia
Romanov. A Imperatriz viúva, exilada na França, estava oferecendo dez milhões
de rubros como recompensa a quem encontrasse sua neta perdida. Podem imaginar a
quantidade de impostoras e golpistas que ambicionaram pôr as mãos nessa grana,
né? Um deles foi Dimitri, um golpista que pretendia treinar uma moça com
qualquer semelhança física com a família real, levá-la à Paris, e fazê-la se passar
pela neta perdida da Imperatriz. Para este feito, ele contava com a ajuda de
Vladimir Vasilovich, que havia sido membro da Corte Imperial Russa, e portanto,
conhecera de perto a família Romanov, sua aparência, sua história, sua
intimidade e seus costumes.
Nesse
ponto também conhecemos Anya, uma jovem que foi criada num orfanato, sem
qualquer lembrança de seu passado ou de sua família, exceto um medalhão que
indica que talvez haja algum parente dela vivendo em Paris.
Qualquer
semelhança não é mera coincidência!
Ao
ser expulsa do orfanato por uma matrona ranzinza, Anya decide seguir o conselho
de um cãozinho que apareceu para brincar com seu cachecol e ir à São
Petersburgo, onde ela pode conseguir uma passagem de trem para procurar sua
família em Paris.
É,
nossa mocinha não pensou muito bem nos detalhes de sua aventura. Mas tudo bem,
porque ela também não consegue comprar uma passagem de trem para Paris. E
parece que o problema não era dinheiro, não – aliás, nem imagino como a órfã
recém-saída do orfanato, sem recursos, poderia pagar pela passagem de trem
internacional, que, na melhor das hipóteses, era cara pra chuchu! O que a impedia
de seguir seu destino, era a falta de um visto de saída do país, algo difícil
de se obter sem um passaporte; o que, claro, é praticamente impossível de se
conseguir sem saber sequer qual é o seu nome.
Felizmente,
uma velhinha na fila, muito camarada por sinal – sacaram? Camarada! Como os
russos costumam chamar todo mundo. Tipo senhor e senhora na Rússia. Não? Então
tá... –, informa que um cara chamado Dimitri pode lhe conseguir os documentos
necessários para sair do país. Mas a moça não soube disso por ela!
E
se vocês acharam o nome meio familiar, estão completamente certos. Esse Dimitri
é o mesmo cara que pretendia recrutar uma moça para enganar a Imperatriz e
receber a recompensa milionária.
E
como spoiler não é problema, pois em se tratando de um desenho o final feliz é
inevitável – exceto por algumas versões de A Pequena Sereia –, e quase tudo é
previsível, é óbvio que esse encontro será providencial para os dois: para
Anya, para obter meios de ir à Paris procurar sua família; e para Dimitri, por
finalmente encontrar uma moça que serve perfeitamente para o papel de Anastásia
Romanov, já que as audições que ele fez até o momento não revelaram nenhuma
candidata com potencial para enganar a Imperatriz.
O
interessante é que o rapaz está promovendo os testes nos arredores do palácio
abandonado do Czar, ao qual tem livre acesso, por causa de seu amigo Vladimir,
o que vem a calhar, para que ele possa comparar qualquer possível candidata com
os retratos de Anastásia que permanecem decorando as paredes do palácio.
E
é lá que os dois mocinhos se encontram. Ao entrar no Palácio Imperial, Anya
começa a recuperar algumas lembranças de seu passado, sobretudo uma canção de
alguém, que costumava embalar seu sono, e um baile realizado num mês de
dezembro.
Com
e sem trocadilhos.
Ela
pede a Dimitri que lhe arranje documentos que permitam viajar para fora do
país, mas o problema é que ela não lembra seu sobrenome, ou qualquer coisa de
seu passado antes dos oito anos de idade.
Se
você pelo menos tivesse dinheiro, né, moça!? Mas para sorte dela, ele também
está indo para Paris, e já tem três passagens compradas. Mas uma delas pertence
à Grã-duquesa Anastásia Romanov. Se ela concordar em responder por esse nome, a
passagem será dela.
Acontece
que ele reparou na incrível semelhança física entre essa moça e o retrato da
pequena Anastásia numa das paredes do palácio, e ela parece ter a mesma idade
que a menina teria agora. E como ela não sabe quem é, também não tem como saber
que não é a Grã-duquesa Anastásia.
E
já que ela não sabe quem realmente é, ou o que anda circulando nas rodas de
fofocas de São Petersburgo, Dimitri achou melhor não contar seu plano de dar um
golpe na Imperatriz, para não desperdiçar um terço da recompensa com a garota.
Como seu interesse é somente chegar à Paris, ele considera que estará fazendo
um favor levando-a até lá. Isto é, se ela decidir colaborar...
No
lugar da Anya, se uma alma caridosa oferecesse me levar à Paris, e possivelmente me transformar numa princesa, eu também não
recusaria. Se eu já não soubesse que meu sangue é vermelhinho como o de tudo
mundo, sem qualquer vestígio de tinta azul, é claro. E Anya não tinha como
saber que as boas intenções que levavam aqueles homens a ajudá-la eram as
mesmas que facilmente pavimentariam o caminho para o inferno.
Os
dois golpistas, então, prepararam tudo para a viagem à Paris, desde os
documentos às passagens de trem – até para o cachorrinho que a conduziu à São
Petersburgo, de quem ela se recusava a se separar. E durante a viagem foram
tentando lhe ensinar os modos da realeza.
Eles
ainda não sabiam, mas assim que a possível Grã-duquesa pôs os pés no Palácio
Imperial, o espectro mortal que havia sido conjurado por Rasputin contra os
Romanov despertou, nos dando um grande spoiler a respeito da moça.
E
não foi o único. Rasputin vendera a alma para conseguir realizar o massacre,
mas aparentemente seu fim eterno dependia de que a coisa toda tivesse sido
feita com sucesso. E como restou um membro da família real russa, as forças das
trevas se agitaram lá no outro mundo, e o vilão também despertou lá no limbo
para concluir a maldição que encomendara. Tudo bem que ele está se desfazendo
em pedaços, mas uma vez que recupera o relicário que é a chave para os seus
poderes, pode cumprir seu propósito sombrio, matar o último Romanov e pegar o último
trem para o Quinto dos Infernos.
Falando
em trem, Vladimir resolve fazer uma social com outros passageiros a bordo da
locomotiva para Paris, e descobre que os novos documentos de viagem são
escritos em vermelho, e não mais em azul, como as falsificações que eles
prepararam.
Já
que ferrou, o negócio é dar no pé. Os dois levam Anya para o vagão de carga,
supostamente para que ela não se misture com a gentalha, mas a moça não nasceu
ontem, e suspeitou desde o princípio que havia algum problema com seus
documentos. O que também não fará diferença por muito tempo, pois o vagão se
separará do resto do trem, ficará desgovernado, sem freio, e eles terão que
saltar.
E
o fato de terem escapado vivos deixa Rasputin muito puto, já que foi ele quem
provocou o acidente. Mas descontar a raiva em seu rato de estimação não é uma
boa ideia, quando o malandrinho pode destruir o relicário do qual sua
existência depende.
E
como fizeram nosso trio de, digamos, heróis perder o transporte, isso atrasará
o cronograma da aventura.
Menos
mal. E agora que arranjaram um novo transporte, eles podem revelar a parte do
B.O. que não tiveram tempo de contar à moça no trem: ninguém chega perto da
Imperatriz sem passar por sua prima Sofia primeiro. Ou seja, para descobrir se
é ou não a Grã-duquesa Anastásia, Anya terá que convencer Sofia de sua
identidade.
Um
argumento que dificilmente funcionaria num tribunal. Anya não é exatamente a
imagem de uma Grã-duquesa, não tem qualquer refinamento, mas eles podem ensinar
tudo o que ela precisa saber sobre Anastásia. Tipo que a Grã-duquesa nasceu num
palácio à beira-mar, que aos três anos já cavalgava um cavalo branco, alguns
nomes em sua árvore genealógica, e outros detalhes sobre seu passado que
Vladimir conhece tão bem. E começam a ficar com a pulga atrás da orelha quando
ela começa a sacar informações corretas que ele não compartilhou sobre membros de
menor importância da família real e seus animais de estimação.
Enfim,
eles vão adestrando sua candidata à Princesa e ficam impressionados com seu
rápido progresso.
No
convés do navio que os levará à Paris, Vladimir ensina Anya a valsar e percebe
que ela e Dimitri estão se apaixonando um pelo outro.
Mas
naquela noite Rasputin entra na mente dela e a faz sonhar com sua família
nadando num rio, levando-a a ficar sonâmbula, e quase pular do navio. Ela é
salva por Dimitri, mas começa a falar sobre a maldição dos Romanov, e sobre os
rostos familiares que viu em seu sonho. Dimitri acha que foi só um pesadelo,
mas se Vladimir já estava com a pulga atrás da orelha, agora é que ele fica
desconfiado, mesmo!
Já
o Rasputin, fica ainda mais puto, e decide ir à superfície, ao mundo dos vivos,
para matar a Grã-duquesa pessoalmente.
O
que não será muito fácil, considerando que ele está literalmente caindo aos
pedaços.
Outra
coisa que não será fácil: conseguir uma audiência com a Imperatriz, pois ela
acaba de receber uma impostora que recitou sua árvore genealógica inteira, mas
afinal, não era sua Anastásia. Sofia promete fazer perguntas mais difíceis à
próxima, mas a Imperatriz já está exausta de ter seu coração partido, e decidiu
desistir de sua busca pela neta desaparecida.
Logo
agora que Vladimir está chegando à Paris, para um reencontro caloroso com
Sofia, e revelar que trouxe Anastásia Nikolaevna de volta ao seio familiar.
Claro
que Sofia fica desconfiada desse reencontro tão conveniente, mas os testes que
faz com a possível Anastásia mostram que ele pode estar certo. Aquela moça não
gosta de chá, apenas água quente com limão, como Anastásia. E ela se parece com
a Grã-duquesa; se bem que as outras também pareciam. O detalhe determinante vem
quando Sofia pergunta como a moça escapou durante o cerco ao palácio, e ela
conta que um menino que trabalhava na cozinha abriu uma passagem na parede. Nem
Vladimir nem Dimitri lhe deram essa informação. O que só pode significar que
ela é a verdadeira Anastásia Romanov!
Se
pelo menos a Imperatriz estivesse disposta a recebê-los...
Mas
Sofia tem um plano para forçar a Imperatriz a escutá-los. Ela assistirá ao balé
russo que estará na cidade naquela noite. Podem aproveitar o intervalo para dar
um pulinho em seu camarote.
É
nessa altura que Dimitri revela a Vladimir que foi ele o menino que abriu a
passagem secreta na parede para Anastásia e sua avó escaparem durante o
massacre. E só há um jeito de Anya saber disso: se ela for a legítima herdeira
do trono russo, a Grã-duquesa desaparecida.
Mas
ele também sabe que princesas não se casam com empregados da cozinha. Então,
quando a identidade dela for revelada à Imperatriz, ele terá que sair de sua
vida para sempre.
Quando
ele a leva ao balé naquela noite, nenhum dos dois tem coragem de declarar seus
sentimentos. Ela espera do lado de fora
do camarote da Imperatriz, enquanto Dimitri entra para anunciá-la
apropriadamente. Mas a Imperatriz já está saturada de ver Grã-duquesas
Anastásias, e prefere viver o resto de sua vida em paz, em vez de continuar
procurando alguém que nunca reencontrará. E mesmo depois de Dimitri contar que
foi ele quem lhes deu fuga durante o massacre, ela se recusa a ouvi-lo, pois
muitos homens já treinaram mocinhas com modos reais, e nunca era sua verdadeira
neta. Além disso, ela já ouviu falar daquele Dimitri, um trapaceiro de São
Petersburgo que estava promovendo audições para encontrar uma impostora
convincente e reivindicar a recompensa.
E
para seu desespero, Anya ouve essa parte, se dá conta de que era apenas parte
de um golpe para ele ganhar dinheiro, e fica furiosa por ter acreditado nele.
E
já que não tem mais nada a perder, Dimitri decide sequestrar a Imperatriz,
ocupando o lugar de seu motorista, para fazê-la ouvir sua história.
Ele
mostra a caixinha de música que Anastásia não conseguiu pegar na noite do
massacre, provando que ele fala a verdade pelo menos sobre ter sido o criado
que as ajudou na fuga. E já que ele é teimoso como uma mula, ela lhe dá a
chance de provar que não trouxe uma impostora, mas vai sem nenhuma sede ao pote
desta vez.
Anya
diz à Imperatriz que não pretendia enganá-la, nem quer seu dinheiro; só
esperava que a senhora pudesse dizer quem ela é, e descobrir se pertence ou não
a uma família, seja ela Real ou não. A Imperatriz deduz que a moça é uma
excelente atriz. Mas Anya reconhece o cheiro de hortelã e óleo para os pés da
avó, e se lembra de uma garrafa com essa essência que derramou num dos tapetes
do palácio quando era pequena, e o cheiro nunca mais saiu. Ela costumava se
deitar naquele tapete quando a avó estava em Paris, para matar a saudade dela.
E nesse momento, a Imperatriz reconhece o medalhão que ela usa. E Anya
reconhece a caixinha de música, com a canção de ninar que ela ouvia antes de
dormir.
Um
reencontro feliz. Pena que Rasputin está de olho em tudo isso, e decide
destruir o baile da recém-descoberta Grã-duquesa.
A
Imperatriz Maria dá a coroa que fora de Alexandra, mãe de Anastásia e
Imperatriz de toda a Rússia à neta, e um belo vestido para anunciar seu
reencontro no baile daquela noite. Mas no que toca a um final completamente
feliz, sinto dizer que a moça ainda está com raiva de Dimitri por todas as
mentiras.
Ela
nem desconfia que ele está caindo fora. Vai voltar à São Petersburgo e tocar a
vida como sempre fez. Isso, até sua avó revelar que ele não aceitou o dinheiro
da recompensa.
Então
a Imperatriz oferece uma escolha à Anastásia. Nada do que ela faça mudará o
fato de ser sua neta, e ela está feliz em saber que está viva, e se tornou uma
mulher forte e honrada. O fato de ter nascido num mundo de joias e títulos
honoráveis, não significa que tenha que viver nele.
Então
Anastásia decide não entrar no baile, e ir atrás de seu grande amor. Ela só não
sabia que Rasputin estaria atrás dela. A moça é atraída para uma armadilha,
onde finalmente se vê cara a cara com seu inimigo e assassino de sua família,
que agora não passa de um cadáver podre, retornando do mundo dos mortos para
terminar o que começou dez anos atrás, matando a última Romanov. Ele faz a
ponte ruir, para afogá-la no Rio Sena, mas bem nesse momento, Dimitri aparece
para salvá-la.
Ninguém
contava com a astúcia do cachorrinho, Pooka! O bichinho, que foi adotado por
Anastásia depois de levá-la à São Petersburgo, e parece ser o mais próximo de
uma fada madrinha nesse conto de fadas, morde o calcanhar do defunto, fazendo-o
soltar o relicário de que depende sua existência, e Anastásia aproveita a
oportunidade para destruí-lo.
Depois,
por gentileza, moça, escove os dentes do bichinho. Não queremos que um cãozinho
tão bonzinho pegue alguma infecção, ou raiva, ou bactéria de fantasma
endiabrado, ou... Enfim, você entendeu...
Assim,
Anastásia decide deixar a coroa no quarto da avó com um bilhete, avisando que
em breve estará de volta à Paris. Depois que ela voltar da lua-de-mel com
Dimitri.
O
que, infelizmente, não aconteceu na história real.
Contexto Histórico:
*
A Revolução Russa na verdade aconteceu entre 08 de março e 07 de novembro de
1917, e não em 1916 como mencionado no desenho. E a família Romanov foi
assassinada em 1918, dois anos depois do que o desenho mostrou.
*
A família Romanov comemorou 300 anos de reinado na Rússia em 1913, três anos
antes do início do desenho.
*
Gregório Rasputine, o feiticeiro e vilão do filme, foi inspirado numa pessoa
real. Rasputine teria sido um camponês russo, tido como um homem santo, que
ajudara o pequeno Alexei, então herdeiro do Império Russo, em alguns de seus
mais preocupantes ataques de hemofilia – doença que afligia boa parte das Casas
Reais Europeias naquele período, geralmente as que descendiam da Rainha Vitória
da Inglaterra. A natureza da relação desse homem com as Romanov, defendida como
inocente por muitas fontes, é tida como controversa por outras. Já surgiram
especulações sobre um possível caso de Rasputine com a Czarina Alexandra, e uma
governanta da família teria ficado escandalizada numa ocasião em que ele entrara
no quarto das crianças, quando todas estavam em trajes de dormir. Apesar dessas
especulações malvadas, sabe-se que as Grã-duquesas gostavam bastante desse
cidadão, a quem consideravam um amigo, e esta amizade era encorajada por sua
mãe.
*
A referência ao mês de dezembro numa das canções mais marcantes do desenho é no
mínimo estranha. Supostamente se referiria ao baile oferecido pelo Czar
Nicolau, e à morte da família duas semanas depois – na trama do filme.
Historicamente, a família de Anastásia foi assassinada em julho de 1918. Já o
verdadeiro Gregório Rasputine, que teria uma relação estranha com a Czarina
Alexandra e suas filhas, foi assassinado em dezembro de 1916. Será que a canção
se referia a isso?
*
A Imperatriz consorte Maria Feodorovna, mãe do Czar Nicolau II, morreu dez anos
depois do assassinato da família Imperial Russa. Se o desenho tivesse situado o
ano certo, ela estaria historicamente morta quando Anastásia saiu do orfanato.
Como adiantaram dois anos, as duas ganharam um tempinho para colocar o papo em
dia.
*
Anastásia tinha dezessete anos quando foi assassinada, o que significa que ela
teria quinze anos em 1916, e não oito como o desenho mostrou.
*
Depois que a família foi assassinada, e os carrascos aparentemente contaram
detalhes macabros do massacre, surgiu a lenda de que uma das Grã-duquesas
poderia ter sobrevivido, já que o atirador estava bêbado quando matou todo
mundo, e uma testemunha relatou ter ouvido gritos de uma das moças depois que o
tiroteio cessou. Supostamente, a moça poderia ter levado só um tiro de raspão,
fingido de morta, e sido ajudada por um dos guardas na fuga. Isso teria
acontecido enquanto os executores espoliavam os objetos de valor roubados dos
corpos da família em outro aposento logo após os assassinatos; alguém poderia ter
tido tempo não vigiado para tirar um sobrevivente da cena do crime.
*
Várias mulheres reivindicaram a identidade de Anastásia Romanov ao longo das
décadas seguintes, sendo a mais conhecida Anna Anderson, interpretada por
Ingrid Bergman no filme de 1956. Exames de DNA feitos após sua morte revelaram
que ela era só mais uma impostora.
Ingrid
Bergman em cena de Anastásia, de 1956.
|
*
Os corpos da família Romanov foram encontados numa vala comum em 1991, junto
com os criados assassinados no mesmo dia. Na contagem dos corpos faltavam dois:
o Czarevich Alexei e uma das Grã-duquesas mais novas, não se sabia se Anastásia
ou Maria, dois anos mais velha que a irmã. Segundo especialistas forenses
russos, o corpo faltante era o de Maria, enquanto que os americanos defendiam
que era o de Anastásia. O esqueleto que foi sepultado com o nome de Anastásia
era claramente mais alto que ela, que era de longe a mais baixinha da família. O
que, sem dúvida, colaborou para a lenda a respeito de sua sobrevivência.
Mas
essa ausência não era de todo inesperada, pois já se sabia da existência de um
documento biográfico escrito por um dos carrascos da família, informando que
dois corpos haviam sido removidos da vala comum e queimados num lugar não
identificado, para evitar que os restos do Czar e de seu grupo fossem imediatamente
identificados, uma vez que a contagem de corpos não estaria correta. Os dois
corpos que faltavam foram encontrados em 2007, numa segunda vala nos arredores
de Ecaterimburgo. Exames de DNA confirmaram que se tratavam dos restos mortais
dos dois filhos faltantes do Czar Nicolau e da Czarina Alexandra: o menino, sem
dúvida, Alexei; e embora não seja possível determinar com total infalibilidade
se a ossada feminina pertencia a Maria ou Anastásia, sabe-se com certeza que
tratava-se de uma das Grã-duquesas. Sendo assim, todos membros da família do
Czar foram comprovadamente mortos em 1918, não restando qualquer dúvida sobre a
impossibilidade da lenda de uma Grã-duquesa sobrevivente ser verdadeira.
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