Mulheres Admiráveis da Ficção

em sábado, 8 de março de 2014


Aproveitando a deixa do Dia Internacional da Mulher, quero citar dez exemplos de personagens (sendo que uma delas é uma figura real, mas tão icônica que se tornou uma lenda) que demonstraram que deixamos de ser o sexo frágil há muito tempo.

Scarlett O’Hara

Acredito já ter falado dela algumas (ou muitas) vezes no blog, mas nunca é demais. A personagem criada por Margaret Mitchell em seu romance “E O Vento Levou” é um bom exemplo de uma mulher de garra. Scarlett, a princípio, era uma garota fútil e mimada, mas amadureceu muito ao experimentar na própria carne os horrores da guerra civil americana, tendo de encarar a fome, doenças, mortes de pessoas próximas (dois maridos que ela não amava, uma amiga, seus pais, sua filha ainda pequena e o bebê que nem chegou a nascer), e lutou com unhas e dentes para conseguir pagar os impostos e não perder sua amada fazenda. E mesmo quando tudo estava contra ela, Scarlett não desanimou. Com um otimismo invejável, ela seguiu lutando suas batalhas, em busca do seu final feliz. Ou, em suas próprias palavras “amanhã será um novo dia...”.


Hester Prynne



Falando em mulheres fortes do século XIX... Este talvez seja o exemplo mais admirável. A protagonista do romance “A Letra Escarlate”, de Nathaniel Hawthorne, enfrentou o preconceito e a moral de toda uma sociedade puritana ao assumir, até com certo orgulho, a punição por seu pecado: carregar indefinidamente a letra “A” escarlate em suas vestes. A de adúltera.

Hester era nova na comunidade da Nova Inglaterra, e de repente encontrou-se grávida de um homem que certamente não era seu marido, pois este não se sabia se estava morto ou se tinha ficado na Europa. E foi justamente a dúvida que poupou sua vida. Como não se podia comprovar que houve adultério, Hester foi condenada a exibir o estigma de seu pecado diante de toda a sociedade, o que para qualquer mulher da época, era uma humilhação moral, talvez o pior de todos os castigos: ser vista por todos como algo semelhante a uma meretriz. E o mais doloroso de tudo: saber que esta punição machucaria tanto a ela quanto à criança que ela parira.

Mas Hester não baixou a cabeça nem mesmo quando seu marido apareceu para chantageá-la, descobrir e vingar-se de seu amante, enquanto tinha a vida dela nas mãos. Se revelasse à sociedade que ele era o marido dela, Hester seria punida com a morte.

Hester enfrentou a sociedade puritana, cuidou de sua filha com grande esmero, e venceu com muito mais dignidade do que aqueles que usam o pretexto da moral para esconder suas próprias transgressões. No fim das contas, a letra vermelha em sua roupa, que deveria ser o estigma da vergonha, tornou-se a marca de seu orgulho, de sua força inabalável, e de sua dignidade firmemente preservada.

Cleópatra

Eu disse que mencionaria mulheres admiráveis da “ficção”, e Cleópatra, tendo sido uma pessoa real, não deveria estar nesta lista, mas sua história fez da notória rainha do Egito um símbolo da mulher poderosa.

Cleópatra foi a última e possivelmente a mais notória governante do Egito, antes de tornar-se província de Roma. Conseguir confirmar seu lugar no trono foi uma batalha a parte, que levou-a a tornar-se amante do imperador romano Júlio César, de quem teve um filho. Embora sua história de amor com Marco Antônio tenha sido mais bela que seu caso com o imperador.

Mas Cleópatra não foi apenas a amante do homem mais poderoso de sua época. Ela também era uma grande estrategista de guerra (possivelmente melhor que seu pai, que conseguiu com seu mau jeito o desprezo do povo egípcio), e uma excelente negociadora. Sem mencionar que ela sabia usar seus atributos para manipular os poderosos a seu favor.

Esta Rainha do Egito foi um grande exemplo de que mesmo os homens mais poderosos tornam-se extremamente vulneráveis quando estão diante de uma bela e inteligente mulher!

Sherazade

Por falar em rainhas inteligentes... Sherazade foi uma lendária rainha da Pérsia, que chegou ao trono pelo caminho mais tenebroso: o rei Shariar havia sido traído pela esposa, e mandou executá-la. Desde então, para não ser traído novamente, ele se casava todas as noites com uma nova mulher, e mandava executá-la no dia seguinte. Foi assim que, um belo dia, ele desposou Sherazade.

Mas ela não era uma mulher qualquer. Sherazade conhecia histórias de várias partes do mundo, aventuras de reis, de heróis, de grandes viagens e fábulas maravilhosas, que começou a contar ao rei na noite de núpcias, mas antes que o sol nascesse, ela interrompia a história na melhor parte. Assim, o rei, curioso por conhecer o final, decidia poupá-la até a noite seguinte. É provável que ela não tenha passado, de fato, mil e uma noites contando histórias ao rei, mas a tradição oriental de evitar números inteiros pode ter originado este cálculo, que representa uma soma muito grande de histórias.

Enquanto deixava suas histórias inacabadas para terminar na noite seguinte e iniciar outra, Sherazade foi conquistando o carinho do rei, que, apaixonado, decidiu poupá-la definitivamente, acabando também com o horror da morte das esposas todas as manhãs.

Mais que uma mulher marcante, e magistralmente inteligente, Sherazade pode ser considerada uma heroína.

Capitu

Dom Casmurro dá título ao livro, mas, vamos falar a verdade, esta história é dela! Foi contada por causa dela, girava em torno dela, e a grande questão do romance (traiu ou não traiu, eis a questão) é mérito dela. Então, como deixar de mencioná-la? Capitu é, e sempre será uma das personagens femininas mais marcantes da literatura brasileira.

Aurélia Camargo

É verdade que José de Alencar criou inúmeras mulheres marcantes, e eu poderia escrever um artigo mencionando cada uma delas por um motivo diferente, mas para esta pequena lista, creio que um exemplo bastará.

A protagonista do romance “Senhora” foi escolhida por ter sido, de todas as mulheres de Alencar, na minha humilde opinião, a mais paciente.

Aurélia era uma moça pobre, que foi desprezada por Fernando Seixas, e trocada por uma moça rica. Descobriu-se que o avô de Aurélia era um homem rico, que a fez herdeira de sua fortuna. Então ela viu nisso a oportunidade de dar o troco em Fernando e recuperar sua dignidade maculada. Como ela fez isso? Comprando o marido!

Sim, Fernando casou-se com Aurélia pelo dinheiro, mas só pôde tocar nela quando reconheceu-se apaixonado pela esposa. E até lá, quem deu as cartas foi sempre ela: controlando seus gastos e fazendo-o saber o tempo todo que, estando numa posição mais vulnerável – sobretudo financeiramente –, ele lhe devia obediência e respeito – o que explica o título do romance.

Em suma, Aurélia foi, das mulheres de Alencar, a única que teve coragem de assumir o posto de “homem da casa”, algo inusitado para o século XIX. Prova de que Aurélia estava muito à frente de seu tempo.

Ana Clara

A protagonista da novela “Fascinação”, de Walcyr Carrasco, é uma das mocinhas mais sofridas e lutadoras que eu já vi na dramaturgia brasileira. Enganada pelo homem que amava, expulsa de casa e grávida, Ana Clara acaba indo parar num prostíbulo. Ela bem que tentou manter-se pura, mesmo naquele antro, mas ao ter seu filho sequestrado pelo cafetão do lugar e dado para adoção, Ana Clara se despe de todo o seu orgulho e de sua honra, e se torna a meretriz mais desejada da Casa de Madame Therèze, para reunir o dinheiro necessário para procurar seu filho.

A mocinha é retirada do bordel pela bondade do tutor de sua antiga melhor amiga, Berenice, que nos últimos tempos de vida odiou Clara por pensar que ela tentava roubar seu marido, o homem que enganou Clara no passado e pai de seu filho, mas que descobriu a verdade antes de morrer e pôde perdoá-la e pedir por ela ao tutor.

Mas o calvário de Clara não tinha fim. Após a morte do tutor de Berenice, ela trilha um caminho semelhante ao de Aurélia, comprando o homem que lhe enganou como marido, mas em vez de vingança, o que Clara precisa é de um homem ao seu lado para ajudá-la a recuperar a posse de seu filho. E quem melhor para isso que o pai do menino? Se ele ao menos acreditasse que o filho era dele...

Enfim, Ana Clara merece lugar nesta lista por demonstrar que não há limites no que uma mãe é capaz de fazer para recuperar seu filho. Ainda que tenha que abrir mão de sua honra.

Carolina Oliveira... Ou Teresa Soares?... Enfim, Gaivota!

Admito que se a novela não estivesse no ar, eu provavelmente não me lembraria dela na hora de escrever esta lista. Mas a verdade é que a Gaivota, de “Café Com Aroma de Mulher” também é um exemplo da força da mulher. Com uma personalidade forte e determinada, a personagem evolui da simples e sonhadora colhedora de café, que viaja para lá e para cá com sua mãe para trabalhar nas plantações, para uma alta executiva do ramo cafeeiro.

Sem muitos recursos nem uma educação primorosa, Gaivota aprende o que precisa na raça, sem depender de ninguém, e faz muitos marmanjos formados se tornarem dependentes dela (de seu profissionalismo, quero dizer). Ela não sossega enquanto não consegue um emprego na empresa exportadora de café da família de seu antigo amor, e assim que é admitida, começa a galgar uma ascensão monumental na empresa, passando rapidamente, com poucas escalas, de recepcionista a sub-gerente da empresa, a segunda maior autoridade no lugar, atrás apenas – a grande ironia – de seu antigo amor, Sebastião Valejo.

A razão porque Gaivota foi escolhida para figurar esta lista é que ela representa a capacidade da mulher moderna de conquistar um lugar de destaque no mercado de trabalho, mesmo em funções antes regidas unicamente por homens.

Andréa Sachs

Ok. Você pode questionar: o que essa mulher está fazendo nesta lista? Certo, Andréa (de O Diabo Veste Prada) não é exatamente marcante, mas sem dúvida merece destaque por um simples motivo: ela era secretária da Hitler da moda Miranda Priestly; desempenhou sua função com profissionalismo e uma dose cavalar de santa paciência, e teve que se ajustar física e mentalmente ao seu ambiente de trabalho. E tudo isso sem jogar a chefe pela janela do vigésimo andar! (Sei lá se o escritório da Miranda ficava no vigésimo andar do prédio, só estou dando um exemplo).

Por essas e outras, acho Andréa Sachs uma mulher de garra. Porque, convenhamos meninas, qual de nós no lugar dela não cogitaria “acidentalmente” prender o bico torto da chefe terrorista com o grampeador?

Hermione Granger

Pode parecer tolice, mas por toda a trajetória da personagem, Hermione definitivamente merece lugar nessa lista. Quando chegou em Hogwarts, aos onze anos de idade, Hermione não era mais que uma irritante sabe-tudo, como (o mestre favorito da que vos fala) Severo Snape tão eloquentemente colocou. Mas logo ela provou ser também uma garota corajosa ao ajudar os amigos em suas aventuras, enfrentando vilões que em tudo eram mais maduros e poderosos que eles, além de ser uma amiga extremamente leal.

Hermione amadureceu nas páginas e nas telas. Enfrentou os mesmos dramas de toda adolescente (uma paixão não correspondida, um namorado de temporada que logo teve que partir para longe, uma luta com um trasgo montanhês no banheiro da escola...), ampliou sua já generosa inteligência, e jamais abandonou seus verdadeiros amigos, mesmo diante do perigo e da morte.

Por tudo isso, Hermione é, independente de seus poderes mágicos, a mulher que toda mulher deveria ser.


Eu deveria fazer aqui também algumas menções honrosas, já que dez exemplos não bastam para demonstrar toda a força da mulher dentro e fora da ficção, então, não vamos nos esquecer das emblemáticas e memoráveis:

Gilda, interpretada por Rita Hayworth no filme homônimo.





Norma Desmond, a estrela decadente do cinema mudo interpretada por Gloria Swanson em “Crepúsculo dos Deuses”.



 
Brünhild, a guerreira apaixonada por Siegfried em “O Anel dos Nibelungos” e nas lendas escandinavas.





Penélope, de “A Odisséia”, que manteve-se fiel ao marido, mesmo sem ter esperança de que ele retornasse com vida de sua viagem.





E Maria, de “A Noviça Rebelde”... Por ser a Maria!




E para não perder o costume (nem a piada):

Seu Madruga

Por nunca ter levantado a mão para uma mulher, mesmo sendo constantemente vítima das injustiças de uma!

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