Um Peter Pan Às Avessas

em sexta-feira, 14 de dezembro de 2018


Uma das minhas autoras favoritas é a alemã Cornelia Funke – autora da trilogia Coração de Tinta. Apesar de ser considerada uma autora infantojuvenil, seus livros – tanto em extensão quanto em enredo – não são exatamente infantis.
Uma grande dose de fantasia, sim; infantilidade, não.

O SENHOR DOS LADRÕES
Título Original: Herr der Diebe
Autora: Cornelia Funke
Editora: Companhia das Letras
Páginas: 367
Gênero: Fantasia

Sinopse:
Cornelia Funke pertence a uma categoria especialíssima da literatura juvenil: muito premiada, é best-seller em diversos países e amada por leitores de todas as idades. Não por acaso, vem sendo comparada à sueca Astrid Lindgren (de Píppi Meialonga) e a J. K. Rowling (de Harry Potter).
Uma das maiores forças de seus textos é a originalidade com que trata o tema da infância e da idade adulta, um dos principais eixos de O Senhor dos Ladrões, que conta a história de um grupo de crianças órfãs que mora num cinema abandonado na cidade de Veneza. Seu protetor é Scipio, o autointitulado Senhor dos Ladrões, um garoto que rouba casas luxuosas de Veneza para sustentar as crianças de rua. Scipio é contratado para um trabalho especial: surrupiar uma asa de madeira da casa da fotógrafa Ida Spavento. O objeto tem propriedades mágicas, e logo todos estarão envolvidos numa aventura onde crianças viram adultos e vice-versa.
O Senhor dos Ladrões teve seus direitos de publicação comprados por mais de 36 países. Depois de grande sucesso na Alemanha, onde vendeu 500 mil exemplares, e nos países de língua inglesa (mais meio milhão de exemplares vendidos), o livro também recebeu seis prêmios internacionais de literatura infantil.

EEEE




O Senhor dos Ladrões é uma espécie de Peter Pan subvertido.
Num primeiro momento, conhecemos Victor Getz, detetive particular contratado por um casal alemão para procurar seus sobrinhos desaparecidos. A irmã de Esther Hartlieb morrera recentemente, e desde então, ela ficara com a guarda dos dois filhos dela, Próspero e Bonifácio – carinhosamente apelidado de Bo –, mas os dois fugiram de sua casa quando descobriram que o casal pretendia criar somente o caçula, Bo, relegando o irmão mais velho a um internato. E como sua irmã enchera a cabeça dos meninos de fantasias a respeito das maravilhas de Veneza, os Hartlieb deduziram que eles só poderiam ter se dirigido para lá – apesar de a cidade ficar a mais de mil quilômetros de Hamburgo, onde residem.
Na sequência, conhecemos as duas figuras procuradas: Próspero e Bo de fato conseguiram chegar à Veneza, onde encontraram abrigo num velho cinema abandonado, que serve como esconderijo para outras três crianças órfãs, Mosca, Riccio e Vespa, que sobrevivem graças à ajuda do Senhor dos Ladrões.
O que ninguém em Veneza desconfia é que este Senhor dos Ladrões é um menino de doze anos, que anda por aí mascarado, e usando botas de salto alto.
Ao longo do livro, nos deparamos com várias revelações interessantes a respeito deste ladrão misterioso – que na verdade, não tem necessidade de roubar –, sobre seus protegidos e também sobre o detetive que está em seu encalço.
A histórias dessas crianças sofre uma grande reviravolta quando o Senhor dos Ladrões é contratado para roubar um misterioso objeto, aparentemente sem valor comercial, na casa de uma fotógrafa da cidade. É onde conhecemos o lado místico da trama – que, naturalmente, em se tratando de um livro de Cornelia Funke, não poderia faltar.
Esta foi uma das mais maravilhosas leituras que fiz este ano, e apesar de ter sido escrito por uma das minhas autoras favoritas, eu o peguei sem qualquer expectativa. Além das incríveis descrições acerca da arquitetura da cidade de Veneza – que por si só já seria capaz de encantar o leitor mais exigente –, ainda nos deparamos com uma história bastante envolvente, acerca de um grupo de crianças para quem a vida não sorriu, e que apesar disso, se arranjavam formidavelmente.
Eu chamei de Peter Pan subvertido porque, enquanto o menino de J.M. Barrie fugira de casa porque não queria crescer, algumas dessas crianças de Cornelia Funke não tinham outro desejo, senão se tornarem logo adultas – e alguns adultos sonhavam ser crianças novamente; um desejo que, na verdade, não era irrealizável.
Cornelia somente pecou em algumas questões: certas soluções mirabolantes demais; alguns personagens condescendentes demais com as travessuras deste grupo de crianças; o passado de algumas das crianças chegou a ser enunciado muito misteriosamente, mas nada de concreto foi revelado; e, com exceção do desejo de separar os dois irmãos, e de ficar buscando uma criança perfeita – ao menos, aparentemente –, não consegui ver nada errado no caráter de Esther Hartlieb, que os sobrinhos descreveram como se fosse a pior pessoa do mundo, mas não chegaram a revelar nenhuma característica que pudesse ser considerada vilanesca, tampouco nos familiares do Senhor dos Ladrões. Tivemos nuances, mas nada que realmente despertasse total antipatia. O único “vilão” bem representado no livro foi Barbarossa, o comerciante de antiguidades para quem as crianças vendiam os produtos que o Senhor dos Ladrões afanava das casas chiques, e somente ele sofreu algo parecido com punição.
Em suma, somos seduzidos pelos personagens bonzinhos, pelas crianças, pelos protagonistas, e por certos personagens secundários, mas faltou certa coragem à autora para embasar melhor o caráter dos vilões. O que de modo algum desanima a leitura, ou desqualifica o livro. Afinal, estamos falando de uma obra essencialmente infantojuvenil, que, dentro desta proposta, nos apresenta uma das mais encantadoras histórias do gênero.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigada pela visita!
E já que chegou até aqui, deixe um comentário ♥
Se tiver um blog, deixe o link para que eu possa retribuir a visita.



Apoie o Blog Comprando Pelo Nosso Link




Topo