Apesar de ser um
filme clássico de terror, berço de um dos mais tradicionais monstros da
Universal Pictures, eu me atreveria a dizer que A Múmia, de 1932 é, na verdade, um filme de amor e morte. Este foi,
talvez, o monstro mais humano vivificado pelo estúdio.
Diferentemente de
seus antecessores, este monstro não veio dos livros. Carl Laemmle Jr. estava
impressionado com a descoberta da tumba do Faraó Tutancâmon, em 1922, e decidiu
criar um filme de terror ambientado no Egito. Esta foi, provavelmente, a
primeira aparição de uma múmia egípcia como figura assustadora no cinema.
O roteiro segue os
moldes tradicionais das histórias de terror da época: uma donzela perseguida
por um monstro que deixa um enorme rastro de morte pelo caminho, e um homem
apaixonado lutando para salvá-la. Segue, inclusive uma linha de raciocínio
similar a de Drácula, quando vista deste ângulo.
No entanto, eu
gostaria de ressaltar que, mesmo numa época de precários efeitos especiais, o
filme traz cenas que devem ter causado, no mínimo espanto, para não dizer medo
no público da época. Como a cena em que a múmia sai de seu sarcófago, deixa uma
marca de terra úmida ao tocar na mesa onde estava o pergaminho e vai embora
arrastando suas faixas.
O rosto do astro
Boris Karloff serviu de tela por duas vezes a um trabalho artístico de
maquiagem: para as primeiras cenas como a múmia de Imhotep, ainda morto no
sarcófago, sob faixas apodrecidas; depois, com o nome falso Ardath Bey, mostrou
uma pele ressecada e flácida que lhe deu aparência semelhante a de um gato, animal
sagrado no Egito antigo.
A atuação de Karloff,
aliás, é um dos primores do filme. O ator, que ficou famoso interpretando o
Monstro de Frankenstein no ano anterior, emprestou uma postura rígida e seu
vozeirão ao personagem, tornando-o assustador quase sem precisar de roteiro.
Mas Imhotep não era
simplesmente um monstro morto-vivo cheio de ódio. Ele foi um homem apaixonado, que
levou seu amor pela princesa Anckesenamon até as últimas consequências,
desafiando a ira dos deuses e do Faraó para trazer sua amada de volta à vida.
Sofreu a pior morte possível e despertou 3.700 anos depois com o único propósito de reencontrar seu amor perdido. Em suas próprias palavras, na cena em que traz
à tona as memórias de sua outra vida, ele diz à princesa que seu amor durou
mais que os templos de seus deuses. Imhotep deu vida ao amor em sua forma mais
destrutiva, alimentando-o até a insanidade.
O filme “A Múmia”, de
1999, é uma versão deste clássico, todavia, pensado para ser uma aventura no
estilo Indiana Jones, perdendo completamente as nuances de horror. Foi escrito
um roteiro que nada tinha a ver com o original, exceto pelo nome da múmia:
Imhotep.
E embora esse remake
seja realmente ótimo, há uma boa razão para o original ser chamado de clássico.