É interessante
observar que em todas as histórias o conceito de imortalidade resiste até a
linha dois da página um. Fulano é imortal, no entanto, há pelo menos uma forma
de matá-lo. Aparentemente, o ser humano não consegue admitir, embora deseje,
que a eternidade não tem fim, e que a palavra imortal significa que não se pode
morrer ou matar. Ou, se me permite usar de uma licença poética: a fantasia
simplesmente não consegue abandonar algumas bases de realidade.
Aqui eu cito
apenas seis dos inúmeros “imortais” da ficção:
Um dos mais
antigos de todos é Aquiles,
personagem principal do poema épico Ilíada,
de Homero. Embora não haja referências nesta obra quanto à invulnerabilidade,
ou mesmo a imortalidade do personagem, em lendas posteriores, conta-se que sua
mãe, Tétis, para torná-lo imortal, logo depois de nascer o mergulhou no rio
Estige. Porém, Aquiles permaneceu vulnerável na parte do corpo pela qual a mãe
o segurara ao mergulhá-lo: seu calcanhar (creio que todo mundo já ouviu a
expressão “calcanhar de Aquiles”, que simboliza a fraqueza de uma pessoa).
Assim sendo, o herói foi morto por uma flecha envenenada que o atingiu precisamente
no calcanhar.
Os imortais que
possuem a mais ampla lista de vulnerabilidades são os vampiros. Em cada versão há pelo menos uma forma de exterminá-los,
das quais cito: cravar estacas de madeira no coração; expô-los à luz do sol
para que se queimem e virem cinzas; desmembrá-los e queimar os pedaços, entre
outras.
Dorian Gray, protagonista da célebre obra de
Oscar Wilde O Retrato de Dorian Gray,
era um jovem belo e inteligente, que foi retratado numa pintura por seu
admirador Basil Hallward. Maravilhado com o resultado da obra, e por perceber
que naquele retrato ele estaria imortalizado em sua forma mais bela e jovem,
imune à passagem do tempo e a qualquer tipo de ferimento ou moléstia, Dorian
admitiu que daria até a alma para que o oposto acontecesse, e o retrato
envelhecesse e sofresse todas as dores em seu lugar, enquanto ele próprio
permanecia jovem e belo tal qual naquele dia, e completamente invulnerável. Seu
desejo foi realizado, e por muito tempo, o retrato envelheceu e sofreu todos os
danos a que seu corpo estava imune.
No entanto, certa
noite, Dorian, sentindo-se culpado pelo assassinato do pintor que realizou o
seu milagre, desejou destruir o retrato que lhe fazia lembrar de sua impiedade,
e que agora estava manchado com o sangue que ele derramou do pintor. Então ele
apunhalou o retrato, desavisado de que ao fazê-lo, ele próprio receberia o
golpe, quebrando o encanto da pintura que voltou a mostrar o rosto jovem que
fora pintado, livre de qualquer mancha, enquanto que seu corpo velho e decrépito
jazia morto ao seu lado.
Um bruxo das
trevas, cujo nome poucos se atreviam a pronunciar, descobriu uma maneira de
dividir sua alma e escondê-la em qualquer objeto, de modo que se algo lhe
acontecesse, as partes ocultas de sua alma permaneceriam vivas, e ele poderia
retomar seu antigo corpo através de um ritual. Mas para tal magia das trevas,
era necessário que ele cometesse assassinatos, pois era a única forma de
dividir sua alma. Não contente em garantir sua imortalidade numa única Horcrux,
ele criou sete!
Foi assim que Lord Voldemort fez um órfão famoso, que
um dia acabou sendo sua ruína. A grande ironia, é que uma de suas Horcruxes era
precisamente o menino que sobreviveu – diga-se de passagem, DUAS VEZES! E ele
próprio acabou por destruí-la.
Quando todas as
Horcruxes foram destruídas, Lord Voldemort ficou novamente vulnerável, sendo
finalmente morto pelo menino que por dezessete anos abrigou um pedaço de sua
alma.
Na Terra Média, o
povo Elfo era imortal, porém, a
imortalidade só existe enquanto os Elfos vivem juntos. Quando um Elfo escolhe
viver com os homens, automaticamente perde o direito à imortalidade. Foi assim
que Arwen Undómiel abriu mão de sua
dádiva, para viver seu amor ao lado do humano Aragorn.
Davy Jones, um homem, apaixonado e traído pela
ninfa do mar Calypso, arrancou o próprio coração para nunca mais sentir a mágoa
do amor, e o trancou ainda pulsante num baú. A lenda, que na verdade não se
sabe onde ou como surgiu, possui inúmeras versões. Esta, foi contada pela
franquia Piratas do Caribe.
A imortalidade de
Jones, nesta e em outras versões, resiste até que alguém encontre o baú onde
seu coração está trancado. Aquele que perfurar o coração pulsante de Davy Jones
não só o matará, como herdará, além do comando de seu navio, o temido Holandês
Voador, a missão de levar as almas dos que morrem no mar ao outro lado.
Descumprir a missão, rende como herança ao novo capitão também os tentáculos do
monstro.
Como vê, a
imortalidade nos livros e nos filmes é muito relativa; depende de uma série de
circunstâncias e tem inúmeros “poréns” que são capazes de anulá-la.
Freud talvez
dissesse a respeito disso que a ideia parte de um medo inconsciente natural:
viver para sempre é uma bênção e uma maldição. Dá certa tranquilidade saber que
nada pode lhe fazer mal, mas tortura saber que terá que assistir à morte de
todos que o cercam.
Pensem no menino
robô de Inteligência Artificial que ficou sozinho após a extinção dos humanos e
compreenderão o fardo.
Incrível! matéria ótima, parabéns!!
ResponderExcluirMuito obrigada Gaby! Fico muito feliz que tenha gostado! Beijos *-*
ExcluirMuito bom você adorei
ResponderExcluirMuito bom você adorei
ResponderExcluirMuito obrigada Rayanne! Fico muito feliz que tenha gostado! Beijão, flor *-*
ExcluirMuito bom
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