O mês do Halloween já acabou, mas minha vontade de falar de
monstros ainda não. E como no mês passado não tive tempo de falar sobre este
clássico da comédia de horror, vou falar agora. Antes tarde do que nunca!
Li há muito tempo um comentário espirituoso que dizia que
depois que a Universal Pictures filmou Frankenstein
ninguém mais leu o livro. Brincadeira ou não, tem seu fundo de verdade, pois
poucas pessoas parecem reconhecer fatos do filme que não estavam no livro e
vice-versa.
Por exemplo: no livro, Victor Frankenstein não deu o cérebro
de um assassino à criatura, nem mesmo por engano; esta licença veio do filme,
mas muitas pessoas tomaram como verdade e depois deste filme, muitos outros
utilizaram a ideia.
Como em “O Jovem
Frankenstein”, de Mel Brooks, onde o assistente repugnante de Frankenstein
roubou por engano um cérebro anormal na faculdade de medicina – diga-se de
passagem, depois de estragar o cérebro genial que ele deveria ter roubado, ao
se assustar com a própria imagem no espelho!
Este filme, aliás, nos deu uma versão muito divertida do
clássico de horror, com piadas leves e bem sacadas que, mesmo depois de ter
assistido diversas vezes ainda são capazes de fazer rir.
A história a seguir é um oferecimento de “Chapolin Vemos,
Cérebros Não Sabemos”!
Nossa história começa apresentando Frederick Frankenstein,
professor de neurociência na Universidade, que prefere ser chamado de Frederick
“Fronkensteen” para dissociar sua imagem de seu antepassado maluco, o Barão Victor
Von Frankenstein, que anos atrás descobriu uma forma de reanimar matéria morta
e deu vida ao monstro feito com partes de cadáveres.
Ao fim da aula, Frederick recebe a visita de um advogado que trouxe o testamento de seu avô biruta, e então ele decide que já é hora de conhecer o antigo castelo de Frankenstein na Transilvânia.
Um espectador desatento aos detalhes provavelmente ficará com
a sensação de que o mesmo trem levou Frederick dos Estados Unidos à
Transilvânia, visto que a película é em preto e branco e há uma sequência de
cenas idênticas, onde só muda o idioma da reclamação do casal de velhinhos.
O filme ainda faz uma porção de piadas visuais, como quando o
assistente corcunda Igor utiliza uma bengala muito curta para descer as escadas
da estação ferroviária e depois a entrega à Frederick para que desça encurvado
do mesmo modo, como é comum em alguns filmes antigos de terror – normalmente
quando o teto sobre a escadaria é baixo!
Depois Igor também ironiza o modo arrastado e vago de alguns
cocheiros de filmes de horror ao falar sobre o lobisomem. Aliás, há uma
curiosidade sobre essa cena: o uivo do lobo foi feito pelo próprio diretor Mel
Brooks.
Ao chegar ao castelo, são recebidos pela governanta, Frau
Blücher, cuja menção sempre faz os cavalos relincharem. Ela os leva para dentro
e os conduz para cima, mas sugere que não se afastem das velas, pois as escadas
são traiçoeiras. Será que ela se tocou que estava carregando um castiçal com
todas as velas apagadas?
Frederick fica no quarto que outrora pertencera ao seu avô,
Victor Frankenstein. No meio da noite ele tem um pesadelo e é acordado por
Inga, a assistente de laboratório. Notem que ela foi levada até lá com essa
função quando ele ainda pensava que seu avô era louco e não pretendia levar a
cabo a experiência, e nem ao menos sabia em que parte do castelo ficava o
laboratório.
Neste momento eles descobrem a passagem secreta para o
laboratório atrás de uma estante no quarto dele, numa cena que me fez lembrar
um clássico episódio de Chapolin Colorado, que provavelmente estava
patrocinando o filme:
A descoberta do laboratório onde seu avô restaurou tecido
morto anos atrás, e de sua biblioteca particular, especialmente o diário
intitulado “Como eu o fiz”, desperta em Frederick o instinto obsessivo biruta
de seu antepassado.
Então, no dia seguinte, durante o café da manhã eles planejam
como será feita a experiência. Precisam de uma cobaia que tenha acabado de
morrer, e para facilitar as incisões, é preciso que ele seja grande. Igor desenha
um retrato falado das descrições que Frederick imaginou para a sua criatura.
O homem gigantesco escolhido foi providencialmente enforcado
naquela noite, então Frederick e Igor violam sua sepultura tão logo os coveiros
terminam de enterrá-lo.
Outra cena hilariante vem agora: primeiro, Igor, com sua boca
podre, encomenda uma chuva enquanto eles desenterram o fulano; depois o caixão
cai da carroça, e eles o colocam no lugar no momento em que vem passando um
guarda, e Frederick finge, com a ajuda de Igor, que a mão do morto que ficou
fora do caixão é sua. Chega a cumprimentar o guarda com a mão do morto. Só não
entendi porque ele foi desenterrar o homem fantasiado de Sherlock Holmes.
Nunca mande um assistente inútil fazer o trabalho de um
office-boy: Frederick comete a imprudência de mandar Igor roubar o cérebro
privilegiado de um cientista morto chamado Hans Delbruck. Não fica claro se
Igor é semianalfabeto, ou apenas estúpido mesmo, mas ao derrubar o cérebro do
cientista – por se assustar com o próprio reflexo no espelho! –, ele rouba o
cérebro de um homem que, segundo ele, chama-se “Ab Normal”, mas na verdade a
etiqueta dizia que o “cérebro” era “anormal” – assim como ele próprio!
Esta troca só é descoberta depois que Frederick dá vida ao
Monstro. A princípio, a experiência parece não ter funcionado, e o cientista
nos dá uma curiosa lição de superação:
Mas quando descobre que o morto está vivo, Frederick deve ter
desejado que não tivesse funcionado. Sobretudo porque ele estava sendo
estrangulado pelo monstro enquanto Inga e Igor brincavam de mímica antes de
aplicar o sedativo na criatura.
Na hora mais inoportuna de todas, eles recebem a visita de um
policial, líder do movimento anti-Frankenstein, que vai até o castelo com a mão
de madeira coçando por um pretexto para crucificar o cientista. Mas como sem
corpo não há crime, e ele não verifica o laboratório, vai embora tranquilamente
– provavelmente com a sensação de que não devia ter distraído Frederick
enquanto arremessava os dardos pela janela, estando seu carro parado na calçada.
De volta ao laboratório, Frau Blücher liberta o monstro da
maca e o deixa escapar do castelo apenas para revelar-se a violinista
misteriosa, e para confessar que teve um caso amoroso com Victor Frankenstein –
como se o beijo no retrato no quarto de Frederick que ele assistiu pelo espelho
na primeira noite já não tivesse evidenciado isso.
Quem assistiu Frankenstein, com Boris Karloff, deve ter se
lembrado dessa cena: o monstro vaga pelas ruas, até encontrar uma menina que
está brincando com flores num jardim. Quem viu o filme original deve ter
sentido pena precoce por pensar que ele mataria a menina – já que foi
exatamente isso que aconteceu no primeiro filme. Felizmente, nesta versão, ele
apenas brincou com ela numa gangorra, arremessando-a pela janela do quarto em
sua cama no exato momento em que os pais, negligentes, porém, preocupados, vão
verificar se um dos dois se lembrou de colocá-la para dormir, ficando aliviados
por encontrá-la dormindo – ou desmaiada; tanto faz.
Em seguida o monstro faz uma visita a um velho cego e
solitário, que pensa que ele é mudo. E aqui também aprendemos algumas lições
importantes:
Aliás, uma participação bem bacaninha de um irreconhecível
Gene Hackman, que, pelo que consta, se ofereceu para interpretar o personagem,
porque sabia que seria “divertido”!
Elizabeth, a noiva de Frederick decide visitá-lo no castelo,
e no meio da noite, depois de ter pedido ao noivo que continuasse aguardando o
casamento para dormir com ela, é sequestrada pelo monstro, e acaba se rendendo
a ele, entusiasmada com seu “schwanztucker”, como Inga havia mencionado quando
Frederick descreveu sua gigantesca cobaia. Não é necessário conhecer a língua
alemã, e nem verificar se essa palavra existe para compreender seu significado.
Frederick e seus assistentes inúteis armam uma emboscada e
conseguem capturar o monstro. Ele entra na cela, disposto a dominá-lo com
carinho, e quando consegue, organiza um pequeno espetáculo num teatro para
apresentar sua criatura. O que começa como uma palestra científica, revela-se
um show de adestramento, onde a criatura domesticada obedece o cientista em
troca de algum petisco – uma gracinha!
Até o público decidir humilhá-lo por ele ter medo do fogo.
Então o monstro tem um ataque de fúria e ameaça atacar as pessoas, deixando seu
mestre desmaiado no palco. Ele é acorrentado, mas ao ser provocado por um
guarda, ele se enfurece e rompe as correntes, matando o guarda e fugindo.
Então, Frederick, provando ser tão bom violinista quanto
cientista louco, atrai a criatura com a música que aprendeu com Frau Blücher
(que relinchem os cavalos!), e espera que ele escale as paredes do castelo até
o terraço para encontrá-lo. Não teria sido mais fácil, talvez, abrir a porta e deixá-lo
subir as escadas até lá?
Enfim...
Finalmente, Frederick faz uma nova experiência, dando à
criatura parte de seu cérebro maravilhoso, confiando – ingenuamente – que Inga
e Igor desligarão a máquina no tempo certo. Talvez eles tivessem conseguido, se
uma multidão enfurecida, liderada pelo guarda da mão de madeira não tivesse
invadido o castelo e destruído o controle das máquinas a menos de sete segundos
para o fim da transferência.
O monstro desperta antes de seu mestre, e faz um discurso
eloquente e emocionado sobre como a sociedade o julgou precipitadamente,
baseado unicamente em seu tamanho desproporcional e em sua feiura, e como
estava grato por Frederick ter decidido usar seu próprio corpo como cobaia para
lhe dar um cérebro que lhe permitisse expressar-se com eloquência.
Então, a multidão, percebendo que o monstro é
intelectualmente semelhante aos humanos comuns, embora tenha sido vivificado
depois de morto, e, portanto, não é mais perigoso do que qualquer um deles – pode
até ser menos perigoso que Igor, por exemplo –, os deixa em paz e vão embora.
Agora tudo se encaminha para um final feliz: depois de
despertar, Frederick casa-se com Inga, e sua ex-noiva, Elizabeth opta por ficar
com a criatura.
Estão lembrados da Noiva de Frankenstein? Ela fez uma
participação especial no final deste filme, desta vez, interpretada por
Madeleine Kahn, a ex-noiva de Frederick, que ergue seus cabelos no penteado
usado por Elsa Lanchester no clássico de 1935 para agradar seu marido
monstruoso.
A grande questão é: durante a troca, a criatura ficou com
parte do cérebro de Frederick; mas e o cientista, o que herdou do monstro?
Pelo canto de Inga, supõe-se que foi o tal do schwanztucker
que conquistou Elizabeth. Só não sabia que o schwanztucker ficava no cérebro!
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